A prostituição já foi uma ocupação respeitada e associada a poderes sagrados.
Mas, com o surgimento da sociedade patriarcal, a independência sexual e econômica das mulheres restringiu-se e as meretrizes passaram a ser mal-vistas.
Que a prostituição é popularmente conhecida como a profissão "mais antiga do mundo", todos sabem.
E, desde que o mundo é dito civilizado, sempre houve prostitutas pobres e prostitutas de elite.
O lado desconhecido dessa história é que a imagem a respeito delas nem sempre foi a que temos atualmente. As meretrizes já foram admiradas pela inteligência e cultura, e também já foram associadas
a deusas - manter relações sexuais com elas era necessário para conseguir poder e respeito.
As "mulheres da vida" sempre tiveram um lugar na História, mas, ao longo dos anos, seu status passou
de respeitável à condenável.
Lá atrás, no período da pré-história, a mulher era associada à Grande Deusa, criadora da força da vida,
e estava no centro das atividades sociais, explica Nickie Roberts, no livro As Prostitutas na História.
Com tal poder, ela controlava sua sexualidade. Nessas sociedades pré-históricas, cultura, religião e sexualidade estavam interligadas, tendo como fonte a Grande Deusa, conhecida inicialmente como
Inanna e mais tarde como Ishtar. Os homens, ignorantes de seu papel na procriação, não eram obsessivos pela paternidade. Foi essa preocupação com a prole que, mais tarde, levou ao surgimento das sociedades patriarcais, com a submissão da mulher.
Por volta de 3.000 a.C., tribos nômades passaram a criar gado e tornaram-se conscientes do papel masculino na reprodução. As sociedades matriarcais da deusa começaram a ser subjugadas.
As primeiras civilizações da era histórica desenvolveram-se na Mesopotâmia e no Egito, e nasceram
desse levante.
Novas formas de casamento foram introduzidas, especificamente destinadas a controlar a sexualidade
das mulheres, afirma a escritora. "Foi nesse momento da história humana, em torno do segundo
milênio a.C., que a instituição da prostituição sagrada tornouse visível e foi registrada pela primeira vez
na escrita".
As primeiras prostitutas da história
As grandes cidades da Mesopotâmia e do Egito continuaram centralizadas nos templos da Grande Deusa. As sacerdotisas dos templos, que participavam de rituais sexuais religiosos, ao mesmo tempo mulheres sagradas e meretrizes, foram as primeiras prostitutas da História, conta Nickie Roberts. O status dessas mulheres era elevado.
Os reis precisavam buscar a benção da deusa, por meio do sexo ritual com as sacerdotisas, para legitimar seu poder. "Nessa época, as prostitutas do mais alto escalão do templo eram, por direito nato, agentes poderosas e prestigiadas; não eram as meras vítimas oprimidas dos homens, tão protegidas pelas
feministas modernas",
"AS CORTESÃS, nós as temos para o prazer; AS CONCUBINAS, para os cuidados de todos os
dias; AS ESPOSAS, para ter uma descendência legítima e uma fiel guardiã do lar."
Na Grécia antiga, as mulheres viviam em um confinamento físico e mental. Mas aquelas que se tornavam meretrizes desfrutavam de liberdade sexual e econômica. O diálogo a seguir, entre a viúva ateniense
Crobil e sua filha, a virgem Corina, narrado pelo escritor clássico Luciano de Samósata (125 d.C. - 181 d.C.), mostra que a prostituição era vista como uma maneira de conquistar a independência:
CROBIL: Tudo o que você tem de fazer é sair com os rapazes, beber com eles e dormir
com eles por dinheiro.
CORINA: Do jeito que faz Lira, filha de Dafne!
CROBIL: Exatamente!
CORINA: Mas ela é uma prostituta!
CROBIL: Bem, e isso é uma coisa assim tão terrível? Significa que você será rica como ela é, e terá
muitos amantes. Por que você está chorando, Corina? Não vê quantos homens vão atrás das prostitutas,
e mesmo assim há tantas delas? E como elas ficam ricas! Olhe, eu posso me lembrar de quando Dafne estava na penúria. Agora, olhe a sua classe! Ela tem montes de ouro, roupas maravilhosas e quatro criados.Foi nesse período, quando os homens começaram a tomar o poder, que também surgiu a
hierarquia entre as mulheres do templo, com um escalão de prostitutas de classe alta, que mantiveram
seus antigos poderes e privilégios. As harimtu, que trabalhavam fora dos templos, foram as primeiras prostitutas de rua. Ainda assim, a conexão entre sexo e religião persistia, pois as meretrizes da rua
continuavam a ser vistas como sagradas, protegidas de Ishtar.
A divisão das mulheres em prostitutas e esposas vem desse início da história patriarcal.
Foi na antiga Suméria, por volta de 2.000 a.C., que surgiram as primeiras leis segregando as duas.
"Nessa época, já começava a ampliar a lacuna entre as 'boas'- dóceis e obedientes esposas e as 'más' - sexualmente autônomas - prostitutas", diz Nickie.
A autora explica que a forma patriarcal de casamento, em que o marido literalmente é dono da esposa
e dos filhos, aprofundou mais ainda o abismo entre a esposa e a prostituta, na medida em que as
instituições religiosas e políticas masculinas foram crescendo.
"Ao mesmo tempo, as leis que cercavam as prostitutas e o seu trabalho tornaram- se mais opressivas",
conta Nickie. Segundo ela, durante toda a história da Mesopotâmia e do Egito, o sexo era ainda considerado sagrado e, apesar das leis, não havia uma moralidade puritana a estigmatizar as mulheres
que se sustentavam vendendo sexo.





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